Metrópoles / Carga viral indetectável: o que significa o termo na luta contra o HIV

Em 2012, a poeta e cineasta Marina Vergueiro, de 41 anos, descobriu que tinha contraído o HIV. Alguns meses depois, a carga viral dela era indetectável, ou seja, a quantidade de vírus circulando no sangue era tão pequena que exames foram incapazes de determiná-la. Em 2017, após um consenso científico, veio uma boa notícia: estando indetectável, o vírus não poderia ser transmitido.

Embora o HIV siga incurável, ele já não é responsável por tantas mortes como no início dos anos 1980. As informações sobre a transmissão do vírus, a adoção de métodos para evitá-lo e os tratamentos para debelá-lo sofreram avanços notáveis de lá para cá. O que ainda persiste como um inimigo resistente à luta contra a aids é a sorofobia, o preconceito.

O HIV é considerado indetectável no paciente quando há menos de 50 cópias dele circulando a cada ml de sangue analisado. Esse é o status de 85% das pessoas que estão em tratamento no Brasil. O Sistema Único de Saúde (SUS) distribui gratuitamente os remédios para controle do vírus e há várias opções para serem usadas no tratamento.

“Ter um diagnóstico rápido e iniciar o tratamento imediatamente é fundamental para se tornar indetectável o mais rápido possível”, explica o infectologista Celso Granato, da Sociedade Brasileira de Patologia Clínica e Medicina Laboratorial (SBPC/ML). “Quanto menor a carga viral inicial, mais rápido se chega ao nível indetectável. Pacientes que são diagnosticados cedo e começam o tratamento logo podem chegar a esse nível em apenas um mês. Quem não consegue, demora mais para alcançar esse estágio”, resume.

“Ter um diagnóstico rápido e iniciar o tratamento imediatamente é fundamental para se tornar indetectável o mais rápido possível”, explica o infectologista Celso Granato, da Sociedade Brasileira de Patologia Clínica e Medicina Laboratorial (SBPC/ML). “Quanto menor a carga viral inicial, mais rápido se chega ao nível indetectável. Pacientes que são diagnosticados cedo e começam o tratamento logo podem chegar a esse nível em apenas um mês. Quem não consegue, demora mais para alcançar esse estágio”, resume.

O percentual de pessoas que inicia o tratamento na mesma semana que recebe o diagnóstico, cenário considerado ideal, representa 42% dos infectados. Cerca 5% só começam o tratamento seis meses após o diagnóstico.

O diretor geral da Aids Healthcare Foundation (AHF) no Brasil, Beto de Jesus, considera que o atraso no diagnóstico e tratamento reflete exclusões sociais sistêmicas do Brasil. “Nos últimos 40 anos, o tratamento de HIV avançou drasticamente. Mas ainda há dificuldades para o diagnóstico e o tratamento de pessoas empobrecidas e com piores condições de trabalho, de vida e de moradia. Via de regra, as pessoas LGBTQIA+ que são negras e periféricas costumam sofrer muito mais com essa exclusão”, resume o especialista.

Exclusão que prejudica o tratamento

Apesar de viver em um bairro privilegiado e de ter acesso à informação sobre saúde, o diagnóstico de Marina foi tardio. “Estava me sentindo muito mal e fui internada em um hospital em 2012. Por mais remédios que tomasse, só piorava. Foi quando um exame detectou o HIV. Minha carga viral já estava bastante alta e a minha quantidade de linfócitos baixa”, relembra.

No caso dela, o medo de fazer o teste do HIV tinha permitido que a doença evoluísse. “Sempre me protegi e achava que tinha uma vida de pouco risco. Mas uns anos antes, no meu primeiro namoro sério, deixei a camisinha de lado. Hoje sei que deveríamos ter feito testes disso, mas eu, na verdade, não imaginava que isso aconteceria comigo”, reconhece.

Marina iniciou imediatamente o tratamento contra a doença e conquistou o status de indetectável meses depois. Entretanto, permaneceu por anos com dificuldades de se relacionar afetivamente. “Usei a poesia, a arte para escapar disso, para entender que poderia ser acolhida”, lembra.

Uma poesia de Marina sobre a luta dela contra o HIV viralizou na web na última semana ao ser interpretada pela atriz Bruna Linzmeyer. O texto reflete a jornada de superação vivida pela cineasta na luta contra o vírus. A pacificação definitiva só veio em 2017, quando ela soube que o diagnóstico de indetectável representava que ela era incapaz de transmitir o vírus.

“O preconceito e a discriminação começaram no dia que recebi o diagnóstico. Quando a gente sabe que tem o vírus, inevitavelmente, entra em um quadro de depressão. A sociedade nos afasta, nos enche de preconceitos, de fake news. A gente passa a sentir que não pode mais amar, nem sentir prazer. Então, imagina o alívio que foi descobrir que “os indetectáveis” não transmitem o vírus”, afirma.

Na segunda-feira (9/12), Marina lançou um performance contra o preconceito chamada de Clube do Carimbo. No vídeo, o corpo dela é carimbado com as frases que ela sempre tem de reproduzir: “Pessoas que vivem com HIV, em tratamento, não transmitem o vírus!”, “Não pega!” e “Não passa!”.

Estar indetectável é estar curado?

O status de indetectável é uma grande conquista do tratamento, mas ele não representa a cura. Os medicamentos impedem que o vírus se multiplique, o que poderia adoentar o indivíduo e infectar outras pessoas.

Entretanto, o HIV é um vírus altamente resistente, capaz de esconder cópias de suas informações genéticas dentro de cromossomos das pessoas soropositivas, o que impede que as defesas do corpo o detenham. Essa é uma das particularidades do vírus que mais dificultam a descoberta de uma cura para a condição.

Por isso, as pessoas com HIV indetectável ainda possuem algumas restrições de saúde: precisam manter o tratamento de forma contínua, não podem doar sangue e as mães com o vírus não podem amamentar, já que o leite materno é potencialmente contaminante para o bebê.

De quanto em quanto tempo é feito o exame periódico?

O Ministério da Saúde recomenda realizar exames de CD4 e carga viral de três a quatro vezes por ano. Essa frequência ajuda a identificar possíveis resistências aos medicamentos. Esses exames são oferecidos gratuitamente pelo SUS aos pacientes em tratamento.

Já para a população em geral, a periodicidade dos testes diagnósticos varia de acordo com as práticas sexuais. Caso aconteça exposições sexuais de risco como o sexo sem uso de preservativo ou uma violência sexual, é recomendado buscar serviços de saúde para testagem e PEP (profilaxia pós-exposição) em 72 horas. Os medicamentos entregues ajudam a diminuir o risco de contágio do HIV.

Em pessoas com frequentes exposições de risco, como homens que fazem sexo com homens, pessoas trans e trabalhadores do sexo, é recomendada a testagem regular a cada 4 meses e o uso da PrEP (profilaxia pré-exposição). Estes medicamentos tomados regularmente também diminuem o risco de contágio do HIV.

Fora dessas circunstâncias, é recomendada a testagem rápida para infecções sexualmente transmissíveis (ISTs) na população sexualmente ativa anualmente.