Morre Giorgio Armani, gênio da moda que fez da elegância sua marca e da luta contra a aids uma causa global
Giorgio Armani, estilista que redefiniu os contornos da elegância da indústria da moda e a escreveu com o próprio nome ao longo de cinco décadas, morreu aos 91 anos nesta quinta-feira (4) em Milão. A informação foi confirmada pela casa global de moda em publicação nas redes sociais.
“Com infinita tristeza, o grupo Armani anuncia o falecimento de seu criador, fundador e incansável impulsionador: Giorgio Armani. O Sr. Armani, como sempre foi chamado com respeito e admiração por funcionários e colaboradores, faleceu serenamente, cercado por seus entes queridos. Incansável, trabalhou até os últimos dias, dedicando-se à empresa, às coleções, aos diversos e sempre novos projetos em andamento e em desenvolvimento”, afirma a nota da empresa.
Giorgio Armani nasceu em 1934 na comuna de Piacenza, no norte da Itália, a cerca de 60 quilômetros da Milão onde, nas décadas seguintes, abriria a primeira boutique para lapidar um império global da moda. Era um rumo improvável na vida de um dos futuros maiores nomes da moda mundial.
Em 1953, entrou em uma universidade de medicina, mas abandonou o curso após três anos para se alistar ao exército italiano. Após a formação militar, foi contratado como vitrinista em uma loja de departamentos em Milão, trabalhando para um tecelão com uma linha própria de roupas.
Naquele novo e diferente emprego, foi apresentado às características de cada tecido, à produção têxtil mesclada ao refino artesanal. Assim, se candidatou para trabalhos com italianos como Zegna e Valentino até, em 1975, criar a própria casa e desafiar as já estabelecidas há décadas. E não foi o único desafio proposto por Armani para toda a indústria.
Uma casa conectada à sociedade
Armani vivia os tempos de glória quando o mundo começou a enfrentar um vírus até então desconhecido: o HIV. No início da década de 90, ele foi um dos primeiros grandes ativistas e lançou desfiles e coleções para arrecadar fundos para associações de acolhimento às vítimas da Aids.
Em 92, a atriz Jodie Foster recebeu o Oscar de Melhor Atriz por O Silêncio dos Inocentes com um Armani rosa e o broche vermelho para chamar a atenção do mundo para a doença. Em 2022, organizou um grupo de caridade para enviar recursos para o combate à Aids em regiões críticas da Europa.
E não seria a única epidemia que o estilista e a casa global iriam enfrentar em sua história.
Armani na pandemia
Durante a pandemia de Covid-19, converteu parte da produção de suas fábricas para a confecção de jalecos para proteção hospitalar, ao mesmo tempo em que doava milhões de euros a hospitais italianos. Em um dos momentos mais dramáticos para a Itália, cancelou um desfile com público e o transmitiu online, antecipando um modelo que se tornaria padrão meses depois.
“Acredito que esse sentimento esteja ligado ao fato de que eu desejava entrar para a profissão médica quando estava crescendo e procurando meu próprio caminho”, afirmou em comunicado à época.
Um gesto emblemático da responsabilidade que sempre imprimiu à sua trajetória. Em 2022, também se fez presente no debate mundial ao retirar a música do desfile em Milão em protesto à invasão da Ucrânia pela Rússia — um conflito que se arrasta até os dias de hoje.
Em 2016, um dos primeiros nomes de peso a adotar políticas mais rígidas de sustentabilidade: decretou o fim de peles animais e a concretização da produção com redução de impactos ambientais, com metas integradas a todas as áreas da marca – da matéria-prima à costura; das lojas às passarelas; dos hotéis às linhas de perfumaria e ótica.
Os primeiros cortes – e um desafio às normas
Se hoje os conceitos agêneros parecem estabelecidos na indústria, Armani encontrou um cenário rígido em relação a papéis de gênero e ousou com uma ideia simples: um paletó masculino. Mas diferente.
Na primeira peça Armani, retirou forros reforçados e enchimentos. A criação foi um modelo elegante, formal e informal ao mesmo tempo, confortável e leve que marca suas criações. Ainda mais importante, alinhados à silhueta masculina e feminina, rompendo um tabu do mundo da moda.
“Seda e linho, na época, eram tidos como materiais para roupas femininas”, disse em entrevista ao jornal The New York Times, então com 82 anos. E começou a ganhar o mundo. “Minhas criações foram feitas para mim e homens como eu que não se reconheciam mais na formalidade rígida das gerações anteriores”, descreve o designer.
Armani ganha o mundo
Em 1978, a atriz Diane Keaton subiu ao palco do Oscar para receber o prêmio de Melhor Atriz pelo filme Noivo Neurótica, Noiva Nervosa, uma das grandes obras do cineasta Woody Allen. Vestida em um paletó leve e refinado com a assinatura Armani. Em 1980, assinou o figurino de Gigolô Americano e conquistou o mundo na pele de um charmoso Richard Gere.
Sempre conectado às mudanças de geração, em 1981 inaugurou o Empório Armani. O mesmo refino, mas mais acessível. Botou no mercado a Armani Jeans. Abriu a primeira loja em Milão. No ano seguinte, inaugurou a linha de perfumes. Na década de 80, a assinatura Armani já estava nas capas de revista, nas passarelas, no cinema, nos aromas e na cultura mundial.
Em 86, pouco mais de uma década após colocar sua marca no mundo, já era condecorado com uma medalha de mérito de cidadão italiano, a maior condecoração do país. Dali em diante, Armani assinou hotéis, carros, óculos, relógios, jóias – levou o império às principais metrópoles do luxo e da sofisticação – sem nunca ausentar a casa de questões sociais.
Mesmo com a expansão exponencial do grupo, que passou a contar com dezenas de linhas e operações em mais de 60 países, o estilista jamais terceirizou seu olhar. Supervisionava pessoalmente campanhas, vitrines, convites de desfile e, até o fim, os ajustes de suas criações no ateliê.
Em 2024, anunciou em entrevistas que começava a preparar uma aposentadoria em “dois ou três anos”. A um jornal italiano, afirmou que sonhava com um futuro em que “não devo ser a pessoa que diz ‘sim’ ou ‘não’ para as coisas”, disse.
No dia 20 de junho, a marca comunicou que Giorgio Armani não estaria presente no desfile da Emporio Armani e da Armani em Milão pela primeira vez em mais de cinco décadas de história.
O comunicado também reforça a vocação do estilista em estar sempre perto de suas criações.”O Sr. Armani trabalhou com sua habitual dedicação nas coleções que serão apresentadas. Embora não possa estar presente fisicamente, acompanhará de perto cada fase dos desfiles”.
Fonte: Agência Aids