IAS 2025: Pílula mensal para prevenção do HIV mostra bons resultados e será testada em larga escala
Um comprimido experimental de uso mensal para a profilaxia pré-exposição ao HIV (PrEP) apresentou resultados promissores e avança agora para a fase III dos ensaios clínicos. Os dados, apresentados na quarta-feira (16) durante a 13ª Conferência da Sociedade Internacional de Aids sobre Ciência do HIV (IAS 2025), apontam para um perfil de segurança favorável e eficácia potencial do MK-8527, desenvolvido pela farmacêutica Merck.
A chegada do MK-8527 pode representar uma virada no modelo de prevenção ao HIV, ao oferecer uma alternativa oral mensal às atuais injeções de longa duração, como o lenacapavir semestral, recém-aprovado nos Estados Unidos. A nova modalidade pode ampliar o acesso à PrEP, especialmente em regiões onde a administração injetável enfrenta barreiras logísticas ou culturais.
“Esperamos que essa opção represente uma mudança de paradigma na prevenção ao HIV”, afirmou a Dra. Rebeca Plank, dos Laboratórios de Pesquisa MSD, durante coletiva de imprensa na IAS. “Com uma dosagem simples e mensal, o MK-8527 pode facilitar o acesso e o uso da PrEP, ampliando a cobertura e contribuindo para o fim da epidemia.”
O que é o MK-8527?
O MK-8527 é um inibidor nucleosídeo da translocação da transcriptase reversa (ITRN), sucessor do islatravir, que teve seu desenvolvimento interrompido após preocupações com a segurança em altas doses. A nova molécula, no entanto, não demonstrou os mesmos riscos, mostrando-se segura em estudos iniciais com pessoas vivendo com HIV e indivíduos HIV-negativos.
O ensaio clínico de fase II (NCT06045507) envolveu 350 participantes nos Estados Unidos, Israel e África do Sul. A maioria era formada por mulheres, com idade média de 28 anos. Os voluntários receberam doses de 3 mg, 6 mg ou 12 mg do MK-8527, ou placebo, a cada quatro semanas durante seis meses. Mais de 90% completaram o tratamento.
Segundo o Professor Kenneth Mayer, do Fenway Health e da Harvard Medical School, o medicamento foi bem tolerado em todas as doses. Os efeitos adversos mais comuns – como dor de cabeça, náuseas e fadiga – foram leves e similares aos observados no grupo placebo. Apenas um evento grave (aborto espontâneo) foi possivelmente relacionado ao medicamento, e não houve casos de soroconversão para HIV.
Farmacocinética e potencial de proteção
Um dos destaques do estudo foi o perfil farmacocinético do MK-8527. As concentrações do medicamento atingiram níveis protetores em até 24 horas após a administração, com manutenção acima do limiar de eficácia por 28 dias nas doses de 6 mg e 12 mg. Isso oferece margem de segurança caso a ingestão do comprimido ocorra com atraso de alguns dias.
“É possível que a proteção comece até mesmo em uma hora”, comentou Mayer. “E a curva de concentração indica que o medicamento se mantém eficaz por todo o período entre as doses.”
Ainda que os dados apontem para a possibilidade de uso bimestral, o professor pondera que o nível de proteção começa a cair após cerca de 40 dias. Por isso, a recomendação segue sendo o uso mensal.
Fase III: novas pesquisas com foco em populações prioritárias
Com base nos resultados positivos, a Merck iniciará agora os testes de fase III em parceria com a Fundação Bill & Melinda Gates e o Centro Internacional de Pesquisa Clínica da Universidade de Washington. Os ensaios EXPrESSIVE-10 e EXPrESSIVE-11 devem recrutar cerca de 9 mil participantes em diversos países.
O EXPrESSIVE-10 terá como foco mulheres e adolescentes sexualmente ativas no Quênia, África do Sul e Uganda. Já o EXPrESSIVE-11 incluirá homens gays, pessoas trans e não binárias em 16 países, comparando o MK-8527 ao regime diário com tenofovir/emtricitabina (Truvada).
“Com apenas 18% da necessidade global de PrEP atendida, há uma urgência em ampliar as opções de prevenção”, afirmou Trevor Mundel, presidente de saúde global da Fundação Gates. “O MK-8527 pode ser um divisor de águas.”
O futuro da PrEP oral mensal
A expectativa é que, se os estudos avançarem conforme planejado, o MK-8527 possa estar disponível para uso até 2028. Para Mitchell Warren, da organização de advocacy AVAC, essa é uma previsão otimista, mas viável.
A aposta na PrEP oral mensal amplia as possibilidades de escolha, respeitando preferências individuais e necessidades específicas. Em um contexto global de desigualdade no acesso à prevenção, inovações como o MK-8527 podem desempenhar um papel estratégico no enfrentamento da epidemia de HIV – desde que venham acompanhadas de políticas públicas inclusivas, distribuição equitativa e escuta ativa das populações mais vulnerabilizadas.
Fonte: Agência Aids com informações