Hepatoaids: Avanços promissores reacendem esperança pela cura do HIV, pesquisador dr. Ricardo Diaz, da Unifesp

A busca pela cura da infecção pelo HIV ganhou novo fôlego na 18ª edição do Hepatoaids, realizada na última sexta-feira (13). Um dos momentos mais aguardados do evento foi a palestra do infectologista Ricardo Diaz, professor da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), que trouxe atualizações animadoras sobre estratégias científicas para erradicar o vírus.

Em sua fala, Diaz reforçou que, embora o tratamento antirretroviral (TARV) tenha transformado o cenário da epidemia e permita que pessoas com HIV vivam bem e por muito tempo, o vírus continua agindo silenciosamente no corpo — e, com ele, permanecem os desafios, os estigmas e as desigualdades.

“Hoje, temos pessoas vivendo mais tempo com HIV do que sem, quando elas têm carga viral indetectável. Isso porque elas fazem exames com frequência, cuidam da saúde. Mas isso não significa que estão livres das consequências. A infecção continua ativa, mesmo que o vírus esteja dormente”, explicou.

Por que ainda buscar a cura?

Com tantos avanços no tratamento, muitos se perguntam se a cura ainda é necessária. Para Ricardo Diaz, a resposta é direta: sim, porque o sofrimento ainda existe. E porque nem todos respondem bem ao tratamento atual.

“A gente tem que olhar para a pessoa que toma o remédio direitinho e ainda sofre com efeitos colaterais, com exclusão social, com o medo. A cura não é luxo. É necessidade”, afirmou.

Para ele, a cura também é um símbolo de justiça e equidade em saúde. “Não é todo mundo que responde bem ao tratamento. Não é todo mundo que tem acesso. A gente precisa curar porque ainda tem muita gente sofrendo.”

Tratamento funciona, mas tem custo

Ricardo Diaz lembrou que os antirretrovirais mudaram a vida das pessoas com HIV, mas não são livres de efeitos colaterais. E muitos deles nem sempre são percebidos no dia a dia. “Uma coisa é intolerância, que provoca a náusea e a dor muscular. Outra coisa é toxicidade, que se acumula silenciosamente no fígado, no rim, no cérebro”, alertou.

Segundo ele, o avanço mais recente é a relação entre alguns medicamentos e o ganho de peso, que pode impactar diretamente a saúde metabólica dos pacientes. “Hoje a gente já consegue ver nitidamente que certos remédios causam obesidade. E esse também é um fator que precisa ser levado em conta.”

Por que o HIV não vai embora?

Mesmo com todo o controle promovido pelos antirretrovirais, o HIV continua no corpo porque consegue se esconder em compartimentos específicos — e, principalmente, porque o sistema imunológico simplesmente tolera a presença do vírus.

“Esse é o ponto central. O corpo ignora o HIV. A gente descobriu, num estudo inédito de metabolômica, que a fosfatidilcolina impede o organismo de montar uma resposta imune contra o vírus. E isso é o que a gente quer reverter”, explicou o pesquisador.

Ele defende que o futuro da pesquisa sobre cura passa por estimular o sistema imune a reconhecer o HIV como ameaça novamente. “Enquanto o corpo tolerar o vírus, a gente não vai conseguir eliminar essas células infectadas.”

A estratégia: eliminar a célula infectada

De acordo com o pesquisador, o principal desafio não é mais combater o vírus, e sim destruir as células onde ele se esconde.

“Se a gente quiser curar a infecção pelo HIV, a gente tem que aprender a matar a célula. A célula que guarda o vírus precisa ser destruída, é isso que a ciência está começando a entender como fazer.”

Ele citou, como exemplo, o uso do medicamento ruxolitinib em pesquisas iniciais. Os estudos indicam que ele pode ajudar a reduzir o reservatório de células infectadas. Ainda é cedo para falar em cura com esse tipo de estratégia, mas os resultados são promissores.

Casos de cura mostram que é possível

Durante a palestra, Diaz relembrou os poucos, mas importantes casos de pessoas que foram consideradas curadas do HIV após transplantes de medula óssea. Nessas situações, o vírus deixou de ser detectado após o organismo ser reconstruído com células imunes resistentes à infecção.

“Esses casos são reais. Provamos que dá para eliminar o vírus do corpo. Não estamos falando de teoria: estamos falando de fatos. E isso nos motiva a buscar caminhos menos invasivos e mais acessíveis”, destacou.

Continuidade da luta

Apesar dos desafios, Ricardo Diaz demonstrou otimismo com os rumos da ciência. Ele defende que a cura do HIV deve ser vista como um objetivo possível — não como uma utopia.

“Tem muita gente boa trabalhando nisso. E não dá pra esquecer: a ciência já curou algumas pessoas. O que a gente precisa agora é descobrir como fazer isso de forma segura, acessível e em larga escala.”

Segundo ele, essa não é uma missão só da pesquisa, mas de toda a sociedade. “A cura é uma construção coletiva. Envolve governos, universidades, indústria, sociedade civil e, acima de tudo, as pessoas que vivem com HIV, que são quem mais nos ensinam.”

Fonte: Agência Aids