Dia Nacional do HTLV: No Brasil, mais de 800 mil pessoas vivem com o vírus; conscientização é essencial para combater a transmissão, o estigma e preconceito

Neste domingo (23), celebramos o Dia Nacional de Visibilidade do HTLV. A condição é desconhecida por muitos, por isso, a data foi criada justamente como uma oportunidade para aumentar a conscientização acerca do tema. Neste contexto, a Agência Aids te orienta agora sobre prevenção, diagnóstico e tratamento.

Cenário epidemiológico

De acordo com dados do Ministério da Saúde, no Brasil, estima-se que mais de 800 mil pessoas vivem com HTLV. Número este que pode estar subestimado, já que muitas pessoas acabam não sendo diagnosticadas.

Mas afinal, o que é HTLV?

O HTLV (Vírus Linfotrópico T Humano) é um vírus que afeta as células do sistema imunológico, podendo causar doenças como leucemia e linfoma, além de problemas neurológicos e autoimunes. Ele pode ser transmitido, principalmente, por meio de relações sexuais desprotegidas, compartilhamento de agulhas ou da mãe para o filho durante a gestação, parto ou amamentação, o que se assemelha bastante à transmissão das formas do HIV. Conhecido como o “primo” do HIV, o HTLV pode ser silencioso, muitas pessoas infectadas pelo HTLV não apresentam sintomas, mas o vírus pode se manifestar mais tarde, dependendo do tipo de infecção e da resposta do sistema imunológico de cada pessoa. Neste sentido, é importante buscar diagnóstico precoce.

Também segundo o Ministério da Saúde, o HTLV (vírus linfotrópico de células T humanas) foi o primeiro retrovírus humano oncogênico causador de doença infecciosa, descoberto ainda na década de 80.

Apesar de ser menos conhecido do que o HIV, ele também afeta o sistema imunológico, mas de maneiras diferentes. O HIV (Vírus da Imunodeficiência Humana) enfraquece o sistema imunológico ao atacar células T CD4, levando à aids quando não tratado, enquanto o HTLV afeta principalmente as células T, mas está mais relacionado a doenças como leucemia, linfoma e distúrbios neurológicos.

Invisibilidade

A invisibilidade do HTLV ocorre por vários motivos, porém principalmente pela falta de conhecimento sobre o vírus. Muitas pessoas não sabem o que é ou que tem o vírus, já que ele não tem tantos sinais visíveis ou sintomas imediatos, o que faz com que seja difícil diagnosticar. O estigma e preconceito, além da falta de campanhas de prevenção são outros fatores que contribuem para a invisibilidade, tornando o problema ainda mais ignorado.

Prevenção

Muitas vezes, a condição só é identificada em estágios mais avançados, quando já causou danos significativos na saúde. Para combater este estigma e promover a prevenção da infecção, confira agora algumas dicas.

As principais formas de prevenção incluem:

  • Uso de preservativos: Faça uso do preservativo interno ou externo nas relações sexuais. A camisinha funciona como uma barreira de proteção, evitando a transmissão do vírus.
  • Redução de danos: Evite o compartilhamento de agulhas e objetos cortantes, já que o HTLV pode ser transmitido por meio do compartilhamento de agulhas, seringas e outros materiais perfurocortantes. Isso é comum em contextos de uso de drogas injetáveis, mas apesar de ser mais raro, também pode ocorrer em ambientes de saúde quando existem acidentes ocupacionais ou em caso de procedimentos não regulamentados.
  • Rastreamento em gestantes: Assim como o HIV, o HTLV pode ser transmitido via transmissão vertical (ou seja, de mãe para filho), então o pré-natal se torna essencial.
  • Testes diagnóstico: A realização de exames para detectar o HTLV pode ajudar na identificação precoce do vírus, principalmente entre populações mais vulneráveis à infecção. A detecção precoce pode facilitar o acompanhamento médico e o tratamento para evitar complicações.

A educação em saúde, através de campanhas de conscientização e divulgação de informações corretas sobre também são estratégias importantes para reduzir o estigma e estimular a prevenção. Vale ressaltar que o HTLV não tem cura, mas o tratamento pode controlar as doenças associadas ao vírus. Medicamentos como os antirretrovirais usados para tratar o HIV ainda estão sendo estudados e desenvolvidos. Para condições como leucemia ou linfoma, os tratamentos podem incluir quimioterapia, radioterapia ou transplante de células-tronco.

O acompanhamento adequado permite que as pessoas com HTLV vivam bem e com qualidade.

Exemplo de superação

Ministério da Saúde 🩵 on X: "A sociedade civil também contribuiu para a consolidação do Brasil Saudável. Representando os movimentos sociais no evento, a líder Adjeane Oliveira, da Instituição HTLVIDA, enfatizou a

Um exemplo de superação e resiliência é a baiana Adjeane Oliveira, de 39 anos. Ela vive com HTLV, é psicóloga, aposentada e presidente da Associação HTLVida. Quem já teve a oportunidade de conviver com Adjeane Oliveira de Jesus sabe bem o quanto é pulsante seu ativismo em defesa das pessoas vivendo com HTLV no Brasil e no mundo.

Adjeane descobriu estar infectada com o HTLV a partir do diagnóstico de seu pai. Ele descobriu a doença ao tentar doar sangue para um amigo, nos anos 1990, e depois disso toda a família foi testada – o exame de sorologia deu positivo para todos.

Desde que foi diagnosticada, vem lutando por visibilidade, direitos e melhores condições para si e para todas as pessoas vivendo com HTLV, enfrentando o estigma, o preconceito e a discriminação.

Em fevereiro de 2024, Ajeane cedeu uma entrevista à Agência Aids, onde contou que sua força vem da vontade de viver e do apoio integral e incondicional que recebe de sua família.  “A gente tinha uma família comum, pobre. Somos uma família de pessoas que querem lutar e vencer na vida. Infelizmente sem muita renda para crescer, então só o estudo seria a opção para a gente conseguir progredir”, destacou.

Nordestina, cresceu em Salvador, em meio a diversos desafios. Ela enfrenta dificuldades de locomoção nos membros inferiores devido à síndrome de mielopatia associada ao vírus do HTLV. “As três filhas dos meus pais são formadas, eu sou psicóloga, tenho uma irmã que é assistente social e a outra é contadora. Meu irmão, que morreu em decorrência do HTLV, estava fazendo curso técnico, mas infelizmente não conseguiu concluir por conta de uma leucemia linfoma”, compartilhou. “Infelizmente, ele veio a falecer. Meu irmão faleceu exatamente no dia 23 de março, que é o Dia Nacional de Enfrentamento ao HTLV.”

“Quando meu irmão morreu eu  já estava mobilizada para falar sobre o HTLV, mas depois da partida dele isso aflorou ainda mais. Desde então, estou nessa luta, tentando fazer o possível para deter o aumento do número de novos casos, ajudar a melhorar a qualidade de vida das pessoas que já têm o vírus e fazer o possível para falar, dar visibilidade e divulgar informações sobre este vírus para ajudar outras pessoas.”

Adjeane ainda compartilhou que logo que descobriu viver com HTLV, não apresentava sintomas ou quaisquer limitações causadas pelo vírus. Estava levando uma vida tranquila, trabalhando, estudando e tinha acabado de ser promovida no trabalho, no auge dos seus 23/24 anos. Até que começaram a surgir algumas dificuldades, como de segurar a urina e de evacuar. ‘‘Eu tinha um médico muito bom na época e tinha um plano de saúde. Esse médico também era pesquisador na área. Quando recebi o afastamento do trabalho, eu estava terminando a faculdade. Foi muito difícil, acho que essa foi uma das maiores dores que tive na vida. Os sintomas só pioravam, eu tinha muita dificuldade de locomoção, além de ter tido uma depressão”, lembrou.

Foi justamente no movimento social que também encontrou fôlego para reivindicar seus direitos e os direitos das outras pessoas que se encontram na mesma situação.

Sobre como se dá as práticas de acolhimento na associação que faz parte, disse: “a gente tenta acalmá-las e dar um direcionamento, porque não é fácil receber um diagnóstico de uma doença que não tem cura, que não tem antirretroviral… Nós, que já vivemos com HTLV há um tempo, estamos com a cabeça mais estruturada, sabendo lidar melhor com as limitações… Temos a missão de mostrar para outras pessoas que estão chegando agora que é possível viver, que é possível administrar, se organizar para sair de casa, para ir aos médicos, para participar das atividades de lazer. Eu acho que o nosso exemplo, de não ficar esperando as coisas caírem do céu, mostra muito!”.

Fonte: Agência Aids