Dia das Mães: Como a prevenção da transmissão vertical do HIV pode garantir uma gestação saudável

Com o Dia das Mães chegando, acende-se um antigo alerta: os riscos da transmissão vertical — quando uma pessoa vivendo com HIV transmite o vírus ao bebê durante a gestação, no parto ou pela amamentação. Esse tipo de transmissão começou a ser observado em 1985, poucos anos após o início da epidemia de HIV/aids em adultos (1983), quando foi registrado o primeiro caso de uma mulher vivendo com HIV que deu à luz um recém-nascido também infectado.

Para saber mais sobre o tema, conversamos com a Dra. Marinella Della Negra, médica infectologista formada pela Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo. Ela possui mestrado em Gastroenterologia e doutorado em Ciências da Saúde pela mesma instituição. Em 1985, foi a primeira médica no país a tratar uma criança vivendo com HIV, tornando-se uma das principais especialistas no assunto. Atualmente, é responsável pela AACPHIV (Associação de Auxílio à Criança e Adolescente Vivendo com HIV), ONG que fundou em 1989 — época na qual, segundo a Dra. Marinella, os cuidados e prevenções para combater o vírus eram muito difíceis.

“Naquela época não tínhamos remédios. Somente perto de 1990 surgiram os primeiros estudos com o AZT (azidotimidina), um fármaco utilizado como antirretroviral. A partir disso concluiu-se que, com a administração desse remédio, você teria uma redução da transmissão vertical”, contou.

Como prevenir?

Com os resultados positivos demonstrados pelo AZT nos estudos de prevenção da transmissão vertical, mais medicamentos com a mesma função foram desenvolvidos. Segundo a médica, se todos os cuidados e procedimentos forem respeitados, a chance de a criança nascer com o vírus pode chegar a menos de 1%.

Para isso, é importante que a gestante inicie o tratamento o mais cedo possível, para que sua carga viral atinja níveis indetectáveis. O medicamento também deve ser administrado ao bebê por um determinado período (a depender da carga viral da mãe). Por último, a especialista destaca a importância de um parto rápido, seguro, em um ambiente adequado e com acompanhamento de uma equipe qualificada.

Hoje, com os avanços no tratamento e no acompanhamento médico, com destaque para o pré-natal, a mulher que vive com HIV pode, inclusive, optar por um parto normal — algo que antes era considerado inviável devido aos riscos de transmissão. No entanto, é fundamental que o parto não ultrapasse quatro horas de duração, para garantir a segurança da criança.

“A mãe que vive com HIV, diferentemente de uma que não vive com o vírus, além de manter todos os exames em dia, precisa manter sua carga viral indetectável e ter um acompanhamento psicológico rigoroso”, completou.

Em seguida, a Dra. reafirma que é imprescindível que, uma vez que a gravidez é planejada, a mulher faça o teste de HIV, já que todas as pessoas que têm relações sexuais correm o risco de se infectar em algum momento. Quanto antes o diagnóstico for feito, mais cedo o tratamento será iniciado e menor será o risco para a gestante e seu filho.

Efeitos colaterais dos antirretrovirais

Os medicamentos, de forma geral, possuem possíveis efeitos colaterais, ou seja, podem causar um ou mais efeitos adversos. A infectologista explica que com os antirretrovirais não é diferente, mas que, com acompanhamento correto e exames como hemogramas e de enzimas hepáticas em dia, os medicamentos administrados hoje em dia podem ser tomados sem muitos riscos para a saúde da gestante e do bebê.

Entre os efeitos colaterais dessa classe de fármacos, os mais comuns tendem a ser gastrointestinais (diarreia, náuseas e vômitos), além de problemas de sono e alterações de humor.


Situação do combate no país

A médica pontua que, infelizmente, o Brasil ainda não pode ser colocado no mesmo nível de referência que outros países mais avançados no combate à transmissão vertical. O principal motivo, segundo a dra. Marinella, é que, embora nas grandes capitais e centros urbanos — onde está concentrada a maior parte da população que vive com HIV — as dificuldades já sejam menores, essa realidade ainda não se aplica a todo o país.

Nas palavras dela: “Nosso país tem uma diferença muito grande de facilidade ao acesso para esse tipo de caso. Em áreas do país onde a estrutura ainda não é das melhores, ainda se encontra muita dificuldade, principalmente pela falta de centros capacitados para lidar com essas mães e seus bebês.”

Para finalizar, a Dra. Marinella, com anos de experiência e envolvimento com a causa, manda uma mensagem para as mulheres que vivem com HIV e sentem medo, por qualquer motivo, de um dia serem mães:

“Felizmente estamos numa época bem diferente da de quando eu comecei. Então, para as mulheres que vivem com HIV e querem ter filhos, hoje você tem a possibilidade de tomar esses medicamentos, fazer o tratamento correto com acompanhamento e ter um risco de praticamente zero de transmissão. Se cuidem durante toda a gestação, pois depois que o filho nasce, é preciso estar bem para ver esse filho crescer e viver a vida tranquilamente.”

Fonte: Agência Aids