Unaids: Mulheres vivendo com HIV na Ucrânia sofrem com deslocamento, violência e falta de acesso à saúde

Lidiia, moradora da região de Zaporizhzhia, viveu meses de incerteza após a invasão em larga escala da Ucrânia em 2022. Seu vilarejo foi ocupado, e a rotina passou a ser marcada por medo constante e pela ausência de recursos básicos.

“Ficar lá era insuportável — especialmente para as mulheres. Era um pesadelo, um medo constante”, relembra. “A situação humanitária era terrível: os veículos de ajuda não conseguiam chegar, alguns eram simplesmente alvejados.”

Além da dificuldade para conseguir comida e itens de higiene para si e para a filha pequena, Lidiia enfrentava outro desafio: não sabia onde encontraria os medicamentos antirretrovirais que precisava tomar diariamente para controlar o HIV.

Fuga em busca de sobrevivência

Quando os estoques de medicamentos se esgotaram, Lidiia decidiu fugir. A viagem que antes durava três horas até a cidade de Dnipro se transformou em um percurso de três dias. Grávida, com a filha nos braços e sem destino certo, percorreu estradas em meio ao conflito até encontrar acolhimento em um abrigo da organização comunitária 100% Life. Dnipro.

O local, criado com apoio do Fundo de Emergência do Unaids entre 2022 e 2024, oferece moradia, alimentação, produtos de higiene e acesso a cuidados médicos — incluindo acompanhamento pediátrico, pré-natal e tratamento do HIV. Na região de Dnipropetrovsk, três desses abrigos foram estruturados para atender, em especial, mulheres deslocadas vivendo com HIV e seus filhos.

“Sou grata por estarmos seguras”, diz Lidiia, três anos após chegar ao abrigo. “Mas ainda sonho em voltar para casa, abrir a porta e saber que a guerra acabou.”

A tripla carga sobre as mulheres

Segundo o Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR), 3,7 milhões de pessoas permanecem deslocadas internamente na Ucrânia, enquanto 6,9 milhões buscaram refúgio fora do país. A maioria é composta por mulheres e crianças, incluindo muitas que vivem com HIV.

Uma pesquisa conduzida pela organização comunitária Positive Women, com apoio do Unaids e da ONU Mulheres, entrevistou 320 mulheres vivendo com HIV entre o fim de 2023 e o início de 2024. O levantamento revelou a “tripla carga” enfrentada por essas mulheres: deslocamento forçado, violência de gênero e obstáculos crescentes no acesso a serviços de saúde essenciais.

Os dados são alarmantes: mais de 70% relataram piora na situação econômica doméstica; um terço perdeu bens materiais; e uma em cada seis perdeu emprego ou negócio. Muitas afirmaram não conseguir atender sequer às necessidades básicas de suas famílias.

No campo da saúde, as dificuldades também aumentaram. Um terço das entrevistadas relatou maior dificuldade para acessar serviços relacionados ao HIV, seja pela destruição de infraestrutura, pela insegurança ou pela falta de recursos. Além disso, os relatos de ansiedade, depressão e estresse pós-traumático são frequentes, agravados pela sobrecarga de cuidados com os filhos e pela separação de familiares.

Resiliência em meio ao caos

Apesar dos obstáculos, a maioria conseguiu manter a adesão ao tratamento antirretroviral graças a redes de apoio comunitário e à distribuição emergencial de medicamentos. Para especialistas, esse dado mostra a força tanto do sistema de saúde ucraniano quanto da mobilização da sociedade civil.

“A resiliência de mulheres como Lidiia, junto com os achados da pesquisa comunitária, destacam a urgência e a possibilidade de agir”, afirmou Gabriela Ionascu, diretora do Unaids na Ucrânia. “Com apoio internacional sustentado, engajamento comunitário e uma abordagem baseada em direitos, é possível garantir o acesso a serviços vitais — mesmo nos tempos mais desafiadores.”

Fonte: Agência Aids com informações do Unaids