Oftalmoligista Lilian Emi Ohkawara explica por que receptor de córnea não foi infectado por HIV em falha no Rio de Janeiro

Cinco pacientes foram infectados pelo HIV após receberem órgãos de um mesmo doador no Rio de Janeiro, em um caso que chocou o país e levantou questionamentos sobre a segurança dos processos de transplante. No entanto, um dos receptores, que recebeu uma córnea, não foi infectado pelo vírus. Esse episódio gerou grande repercussão e colocou em evidência a necessidade de revisar e aprimorar os protocolos de triagem no Brasil.

A empresa PCS Saleme, responsável pelos laudos que atestaram a segurança dos órgãos, é acusada de emitir relatórios falsos, deixando escapar a infecção nos cinco receptores. Mas por que o paciente que recebeu a córnea não contraiu HIV?

Para esclarecer essa questão, a Agência Aids entrevistou a oftalmologista Lilian Emi Ohkawara, do Centro de Referência e Treinamento DST/Aids, que explicou que a ausência de infecção está diretamente ligada à natureza peculiar do tecido da córnea. “A córnea é um órgão avascular, ou seja, não possui vasos sanguíneos. Isso significa que a transmissão do HIV por meio desse tecido é extremamente improvável, já que o vírus não teria como chegar até ele”, detalhou a especialista.

Segundo Dra. Lilian, a nutrição da córnea ocorre por meio de fluidos como o humor aquoso e o filme lacrimal, não sendo necessária a presença de vasos sanguíneos, como ocorre em outros órgãos sólidos, que foram responsáveis pela infecção nos outros pacientes. A médica ainda destacou que há outros relatos na literatura médica de casos semelhantes, nos quais receptores de córneas não foram infectados por HIV, apesar de o doador ter transmitido o vírus a outros receptores de órgãos.

Mesmo sem infecção neste caso específico, Dra. Lilian ressaltou a importância dos cuidados e dos protocolos rigorosos que envolvem a doação de córneas. “Exames sorológicos são realizados para HIV, Hepatite B e C, além de uma triagem clínica detalhada do doador”, explicou. Além disso, há critérios rigorosos de exclusão em situações de morte por causas desconhecidas ou doenças neurológicas de origem indeterminada, que visam garantir a segurança do receptor.

A oftalmologista também enfatizou que, apesar de o paciente que recebeu a córnea não ter contraído a infecção, ele ainda será monitorado de perto. “Complicações podem surgir, como rejeição do tecido, infecção ou falência da córnea, o que torna o acompanhamento médico essencial após o transplante”, afirmou.

Por fim, Dra. Lilian ressaltou a importância de uma fiscalização mais rígida no processo de triagem de doadores, mas defendeu a continuidade dos transplantes e doações de órgãos. “A doação de órgãos melhora a qualidade de vida de muitos pacientes, e, no caso da córnea, pode devolver a visão a quem a perdeu”, concluiu.

Fonte: Agência Aids

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